terça-feira, 12 de fevereiro de 2008

Parabenizando Nelson Leve


Por ocasião do meu aniversário natalício que hoje(12 de Fevereiro) se comemora, chegou-me de Lisboa o texto que se segue assinado pelo punho(dedos no teclado) do grande Eduardo White:


"Tem conhecimento o homem puro dessa sede disfarçada que, agora, anda pela Nação. Espantado, ele vê pelas ruas aqueles que antes permaneceram todavia escondidos. Repara em seus risos grandes, as cambalhotas que dão por dentro da honestidade. Repara nas suas mãos levantadas, no modo como se misturam com os homens verdadeiramente honestos.

Perscruta, o homem puro, as suas poses pelas cidades, as suas caras de anjo, os seus retóricos discursos sobre a miséria absoluta e a liberdade, vê-os cantar aquelas músicas banidas, antes, em outras casas, dançar com o estatuto que não têm os seus carros de luxo.

O homem puro examina tudo muito bem examinado até as conversas em que denigrem os seus camaradas. Segue-os muito bem seguídos naqueles ares de homens apagados, naqueles ares de homens que nunca fizeram mal nenhum e sente que se esforçam por terem uma natureza funda, na natureza daquela suposta preocupação profunda com o que não anda bem com s cidadãos.

Pergunta o homem puro: esqueceram-se, então, esses senhores, dos mortos que jazem pelo País, daquelas ossadas humanas que nunca tiveram sepultura nenhuma, dos que sucumbiram às baionetas e às metralhadoras do ódio e da carnificina, dos inocentes que não sobreviveram aos tiros dos seus canhões?

Estes homens conclusivos quando falam em nome de duas liberdades, estes homens que dialogam com a algazarra e que hoje se tratam em público com tanta cordialidade? Mas estes homens não se importam, estes homens que resvalam pelo nosso destino, estes, os portentosos nas suas sagradas tarefas de ver no outro um inimigo, não se importam como facto de estarem tão perto ainda do nosso passado.

Então o homem puro lembra-se de ter lido, um dia, George Mangakis: Aquilo a que chamámos história é um esforço feito em favor dos outros, pago muito caro com o sofrimento dos homens.

Deseja o homem puro: bom seria que entre os homens da minha pátria imperasse o bom senso e a paz. Mas o poder é um íman, o poder seduz com outras especiarias.

Ao poder se agarram as humanas garras da prepotência e da religião. Ninguém dele quer abrir mão. Por causa disto o homem puro se entristece, cresce dentro dele o cuspo da revolta. É que no mercado das novas promessas, no depositário das futuras mudanças, já se vê em fartura, com os velhos e os novos mercenários, os bajuladores precisos e os intriguistas mesquinhos.

Óh, como esvoaçam pelo céu da Nação as sequiosas e carnívoras aves de rapina, como pululam pelos circos dos jornais os viscosos omnívoros da adulação, como divertem as bancadas esses palhaços, esses embaixadores da nova revolução.

Dos seus ares muito ocupados, estas abóboras cheias de ranho estendem a língua, mostram o rabo. Uns à direita, outros ao centro, outros, ainda, mais à esquerda da gorda esquerda. Todos muito reocupados como estado da Nação. Vejam-no-los nos jornais, nas revistas sociais e nos programas de televisão, vejam-no-los por detrás dos seus risos brancos, o que suscitam nas simpatias: a sua arma poderosa, o poderoso canhão da calúnia que manejam com uma infantil paixão.

E vejam o clero como fala da sua arrogante sapiência divina, vejam as batinas da inquisição no meio da discussão. Como ele é altivo, como ele esconde por detrás de Deus a sua bifurca língua viperina, como ele ginga a sua inquestionável teologia, como ele proclama, por entre a falsa virtude, o perdão e a compaixão que se fosse justa era para ele que as pediriam.

Vejam como Gustave Le Bom viu los irmanos, da democracia que no lo sabem que nos otros sabemos que dominam-se mais facilmente os povos excitando as suas paixões do que ocupando dos seus interesses.

Olhando tudo isto, o homem puro procura os seus bolsos vazios e guarda neles as mãos para as proteger do frio. Olhado para dentro, não se admira do comício a que, há pouco, assistiu. As promessas que ouviu, o País futuro que anteviu, a prosperidade na largueza com que o orador a distribuiu. Mas não se admirou. Sabia que tudo morreria ali. E disse de si para si Bianciardi:

A política (…) há muito tempo deixou de ser ciência do bom governo e, em vez disso, tornou-se na arte da conquista e da conservação do poder."

4 comentários:

chapa100 disse...

nelson os meus parabens pelo aniversario e previlegiado por teres este grande poeta como teu amigo, o eduardo white. texto bonito ele "escreveu-te".

Nelson disse...

Muito obrigado Chapa. Que bom que voltou as ruas bem antes.
Força.
Abraços do Aniversariante.

Reflectindo disse...

Parabéns pelo aniversário, mas também por este texto que recebeste do grande poeta e que não serve para só ti mas eu que também o deleito.

jpt disse...

E eu aproveito - presumindo que o Eduardo por cá passe - para deixar ao poeta um abraço, até saudoso. Ouvira que estava na minha terra, tenho agora a certeza.