sexta-feira, 27 de maio de 2011

SOBRE A CRISE


A suposta crise no Movimento Democrático de moçambique(MDM) gerou vários artigos, análises e opniões nos jornais, postagens e comentário em blogs. Tenho estado a acompanhar uma interessante série que já vai no seu número 11, lá no Diário de um Sociólogo do Dr. Carlos Serra, que entre outros aspectos, de alguma forma ajuda e muito a entender o “espírito” por trás do que se diz em torno da tal crise.
Um dos pontos que chamou atenção na abordagem do Dr.Serra, parece ser a “hipocrisia” dos que se preocupam com oque o MDM está a viver, seja lá oque for. Vale a pena acompanhar!
  

Sobre crise 1 

"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)

Uma nova série que me servirá para escrever um pouco sobre uma palavra chamada crise, muito utilizada no nosso país no sentido político. Acho que em todos nós, portadores do pensamento identitário - propenso à invariância e, portanto, rebelde à contradição -, a imagem de uma crise assemelha-se àquela que figura na imagem em epígrafe: a de uma corda que se partiu.

Sobre crise 2
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta nova série, sugerindo o seguinte sumário:
*Conceito de crise
*Pensamento identitário, diferença opinativa e crise
*A concepção de crise como cataclismo
*Crise como instrumento moral
*Crise como instrumento de propaganda
*Três exemplos de imputação críseca em Moçambique

Sobre crise 3
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo algumas ideias sobre o primeiro ponto do sumário que vos propus no número anterior.
No seu sentido médico original, a crise é uma perturbação somática, uma alteração do estado - considerado habitual ou normal - do corpo. Em termos de sistemas sociais, é uma perturbação num determinado estado de coisas ou de fenómenos, um curto-circuito em coisas ou fenómenos considerados normais, habituais. A crise é, ao mesmo tempo, um revelador de conflitos que não estavam visíveis e um accionador de novos fenómenos. Mas, fundamentalmente, a crise deve ser tomada como um fenómeno ou como um conjunto de fenómenos bloqueando a reprodução de um determinado sistema. As crises podem ser regressivas ou progressivas, regressivas quando são postos em acção processos de retorno a uma situação anterior, progressivas quando são desencadeados processos dando origem a uma nova situação. Não poucas vezes, as crises sociais são acompanhadas de mecanismos destinados a expulsar o agente ou os agentes causadores da perturbação, a identificar e a expulsar o suposto responsável ou os supostos responsáveis.

Sobre crise 4
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo algumas ideias sobre o segundo ponto do sumário que vos propus, a saber: pensamento identitário, diferença opinativa e crise.
De forma muito abstracta: não é nada fácil entrar na cavidade das coisas, percorrer os labirintos dos fenómenos, seguir a pista das contradições e dos conflitos, fugir ao reino da classificação rígida e da não-contradição, ao substancialismo, ao império da identidade unívoca.
Amamos instintivamente o Mesmo, a diferença perturba-nos.

Sobre crise 5
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo algumas ideias ainda sobre o segundo ponto do sumário que vos propus, a saber: pensamento identitário, diferença opinativa e crise.
O pensamento identitário, com o seu horror às diferenças, com a sua filosofia da suspeita, fica sempre muito preocupado quando a diferença opinativa toma curso, quando as ambivalências e as mediações surgem, quando as bifurcações são a paisagem da vida. A diferença opinativa em política causa especial horror. Quando surge, por exemplo nos partidos políticos, é frequente falarmos em crise. Mais: partidos apologistas da diferença opinativa tornam-se os maiores apologistas do Mesmo quando se encontram como gestores do poder político. Na verdade, o nosso apego ao Mesmo é tão profundo que o Diferente nos torna intolerantes, em particular quando estão em jogo recursos de vida e poder.

Sobre crise 6
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo algumas ideias ainda sobre o terceiro ponto do sumário que vos propus, a saber: a concepção da crise como cataclismo.
Acho que muitos de nós não gostam nem da corda nem do arco, pois ambos representam sistemas em tensão perpétua. A tensão aborrece-nos, amamos decididamente a uniformidade, a antífrase é um problema. Se acontece surgir um fenómeno que se afaste do nosso imenso amor pela simetria, pela obediência, logo emitimos a perturbada sentença de que estamos perante uma crise. Mas não só: a crise não é percepcionalmente um fenómeno simples, é um fenómeno ruidoso, final, cataclísmico. Crise representa uma espécie profana de fim do mundo. Por exemplo, se num partido surge uma opinião contrária ou se ocorre um cisma, imediatamente afirmamos que chegou o fim do partido, imagem figurada do fim do mundo. Uma crise aparece-nos como um cancro. É profunda, creio, a nossa idealização do estável, do imutável.

Sobre crise 7
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo mais algumas ideias, mais algumas hipóteses ainda sobre o terceiro ponto do sumário que vos propus, a saber: crise como instrumento moral.
Escrevi no número anterior que a crise, quer dizer, a crise que nós achamos que existe, a crise por nós injectada nos fenómenos, tem um duplo aspecto moral: é ao mesmo tempo o que não desejamos que seja e o que desejamos que seja.
Na verdade, o nosso apelo ao Mesmo, ao Uniforme, leva-nos a recusar o que surge como Diferença, como Descaminho nos roteiros das nossas vidas e dos processos sociais. Por isso estamos sempre ou quase sempre - em meio ao pensamento identitário, em meio à obsessão pelo Igual -, aptos a tecer profusas considerações morais sobre o que consideramos ser uma crise indesejável. Moralizar é a nossa maneira habitual de analisar crises (estudem os jornais e aperceber-se-ão rapidamente disso). É o deve ser e não o é, o que nos interessa. Em termos políticos, não apreciamos nada que surjam opiniões divergentes nos nossos partidos, especialmente se o sistema é multipartidário e entendemos que as fraquezas podem ser aproveitadas pelos adversários. Existe todo um tenaz esforço formal e informal para decapitar a Diferença e o Protesto, atribuindo-os aos maus designíos de forças obscuras, de forças consideradas antinaturais e antipatrióticas.

"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo algumas ideias ainda sobre o terceiro ponto do sumário que vos propus, a saber:crise como instrumento moral.
A crise, quer dizer, a crise que nós achamos que existe, a crise por nós injectada nos fenómenos, tem um duplo aspecto moral: é ao mesmo tempo o que não desejamos que seja e o que desejamos que seja.
Sei quão tola é a questão assim enunciada, mas no próximo número tentarei tornar claro o que parece confuso.
 
Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo mais algumas ideias, mais algumas hipóteses ainda sobre o terceiro ponto do sumário que vos propus, a saber: crise como instrumento moral
Escrevi no número anterior que a crise, quer dizer, a crise que nós achamos que existe, a crise por nós injectada nos fenómenos, tem um duplo aspecto moral: é ao mesmo tempo o que não desejamos que seja e o que desejamos que seja.
Agora, vamos ao que desejamos que seja.
Na verdade, há coisas que muito desejamos que sejam ou aconteçam na nossa crise. O que mais desejamos é a queda dos outros, a sua ruína, o seu desaparecimento político. A crise é, para nós, um real prazer, um linchamento apetecido.
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo mais algumas ideias, mais algumas hipóteses desta vez sobre o quinto ponto do sumário que vos propus, a saber: crise como instrumento de propaganda.
A crise é uma arma apetecida no combate político. Qual crise? A crise dos outros. A este propósito, é possível transformar a crise num triplo momento: (1) falsa preocupação com o mal que é suposto apoquentar os outros, (2) imensa alegria com esse mal e (3) receituário piedoso.
Prossigo mais tarde.
 
Sobre crise 11
"Onde a diferença falta, é a violência que ameaça" (René Girard, A violência e o sagrado)
Avanço um pouco mais nesta série, sugerindo mais algumas ideias, mais algumas hipóteses ainda sobre o quinto ponto do sumário que vos propus, a saber: crise como instrumento de propaganda.
Permito-me recordar o que escrevi no número anterior: a crise é uma arma apetecida no combate político. Qual crise? A crise dos outros. A este propósito, é possível transformar a crise num triplo momento: (1) falsa preocupação com o mal que é suposto apoquentar os outros, (2) imensa alegria com esse mal e (3) receituário piedoso.
Quando surge o que se entendemos ser uma crise política na casa do Outro, damos imediata conta pública do quanto estamos preocupados, na superfície das preocupações navega o que parece ser um genuíno pesar, um sincero anseio pela alteridade opinativa ou comportamental. No bojo das coisas, porém, viaja uma imensa alegria com o que entendemos estar a passar-se. E entre a falsa preocupação da superfície e a nua realidade do interior - ser perversamente dúplice no cenário de uma hipócrita conversão na estrada de Damasco -, irrompe um receituário piedoso, cheio de peregrinas mezinhas do género "portem-se bem, tenham cultura digna, procedam como nós". O centro do poder despreza e/ou odeia a periferia política, canibaliza-a analiticamente em permanência através de eufemismos sem fim.



 

quinta-feira, 26 de maio de 2011

SEGUNDO AUTARCA, MUNICÍPIO DA BEIRA PODE ESTAR A PAGAR 40 MIL DÓLARES POR CADA PREMIAÇÃO DE DEVIZ SIMANGO

Périto sénior em matéria de Administração e Markting com conhecimentos sólidos sobre a PMR-África, revela ao O Autarca que esse montante serve para suportar pagamentos a assessoria prestada com a elaboração dos termos de sustentação da distinção, pagamentos das páginas da revista para a inserção dos conteúdos ou pressupostos da premiação, e ainda deslocações e alojamento tanto dos promotores da revista assim como do próprio edil e membros da sua comitiva que geralmente participam desses eventos que acabam se transformando mais num jantar do que propriamente uma cerimónia.

Um perito sénior em matéria de Administração e Markting com conhecimentos sólidos sobre a PMR-África, revista sul africana que nos últimos anos tem estado a distinguir Daviz Simango alegadamente pelo seu desempenho autárquico, denunciou ontem ao nosso jornal que o município da Beira pode estar a pagar àquela publicação cerca de quarenta mil dólares norte americanos (aproximadamente 1.3 milhões de meticais) por cada premiação ao seu edil.
Segundo o périto baseado em Maputo, o montante inclui os pagamentos a assessoria prestada com a elaboração dos termos de sustentação da distinção, pagamentos das páginas da revista para a inserção dos conteúdos ou pressupostos da premiação, e ainda deslocações e alojamento tanto dos promotores da revista assim como do próprio edil e membros da sua comitiva que geralmente participam desses eventos que acabam se transformando mais num jantar do que propriamente uma cerimónia
. A fonte indicou qualquer sujeito e ou instituição pode encomendar àquela revista para a sua distinção, uma prática comum nos últimos tempos geralmente usada por organizações empresariais que pretendam promover a sua imagem no mercado ou obter créditos junto de instituições do seu interesse.
Essa revelação, no entanto, desvaloriza o mérito das sucessivas distinções do autarca Daviz Simango pela PMR-África, porquanto entende-se uma premiação é um acto de recompensa ou honra concedida alguém, o que difere de um acto de aquisição, pois o prémio ou a honra o normal não se compram, se não passa a ser uma auto-premiação ou pseuda-premiação.
Uma vez que Daviz Simango já foi premiado cinco vezes pela mesma instituição e tendo em conta a denúncia feita ao nosso jornal pelo perito em matéria de Administração e Markting baseado em Maputo e que, sabe-se, já ajudou algumas organizações a aderirem aquele negócio, o município da Beira pode ter despendido até aqui cerca de duzentos mil dólares (aproximadamente 6.6 milhões de meticais) para suportar a distinção do seu edil.
Trata-se de um valor bastante elevado que certamente sugere as entidades competentes averiguarem a sua proveniência, porquanto sabe-se essa despeza não consta de nenhuma rubrica das contas do município.
Última distinção não teve o impacto desejado
Entretanto, a nossa fonte em Maputo considerou a última premiação de Daviz Simango pela revista sul africana PMR-África não surtiu o impacto que seria de desejar por parte do edil da Beira, ao não ter merecido destaque em quase toda imprensa nacional.
Aliás, na nossa edição anterior apresentamos argumentos de um jornalista em exercício na Beira que disse a distinção de Daviz Simango nesta segunda-feira não suscitou interesse por parte da mídia uma vez que esta já tem a percepção de aqueles prémios não passam duma farsa para atrair simpatia popular.
Na opinião do mesmo jornalista, a história desses prémios sabe-se muitas vezes são encomendados, envolvem pagamentos, e observou que os critérios de atribuição não são claros, pior em relação a uma cidade que se sabe enfrenta sérios problemas desde o saneamento, estradas, limpeza, fraca atracção de investimento o que torna a urbe com taxas elevadas de desemprego, criminalidade, e ainda os problemas que sistematicamente se levantam na imprensa sobre a própria gestão que tem assumido um carácter nepotista e de certa arrogância. “São aspectos que acho deviam ser levados em conta para uma cidade que conquista o quinto prémio consecutivo, piora ainda o facto de os mesmos serem atribuídos sempre pela mesma instituição”.
Cúpula de Daviz usou truque para simular que houve muita aderência
Ainda na edição de ontem referimos que Daviz Simango não conseguiu nesta terça-feira renovar a dimensão de recepção que já teve outras vezes quando foi receber o prémio de melhor desempenho autárquico em Moçambique.
O número de pessoas que o foram receber anteontem no Aeroporto Internacional da Beira não superava sequer um quinto do universo que vinha se registando das vezes anteriores. Há quem tenha feito uma contagem superficial e disse ao nosso jornal não passavam sequer quinhentas pessoas, apesar de o prémio que trouxe anteontem ser ainda maior que os anteriores por se referir de melhor desempenho autárquico em toda África Austral, enquanto doutras vezes se referia apenas ao conjunto das trinta e três autarquias moçambicanas.
Um influente actor político na Beira disse ontem ao nosso jornal que Daviz Simango e a sua cúpula percebendo da fraca afluência popular, usaram uma estratégia que foi barrar o trânsito na via usada simulando que todas restantes viaturas que seguiam atrás faziam parte da caravana, para criar uma sensação na opinião pública de ter sido recebido com pompa e circunstância.
Esse cenário, segundo a fonte, criou sérios transtornos à vários automobilistas que acabaram não conseguindo cumprir os seus compromissos porque não puderam chegar a hora uma vez o trânsito estava bloqueado.
O AUTARCA – 26.05.2011

NOTA:
Todas as avaliações deverão ser feitas por peritos, seja sobre que matéria for. Mas a credibilidade da avaliação só se dá quando o perito for devidamente identificado. Avaliações de peritos ”anónimos” não dão credibilidade, independentemente da justeza da avaliação. De quem se trata, afinal?

Fernando Gil
FONTE: MACUA DE MOÇAMBIQUE 

sábado, 14 de maio de 2011

PORQUE A POPULAÇÃO DEVE DEVOLVER OS "7 MILHÕES" ?

“Na verdade, ao não devolver o dinheiro emprestado há quatro anos, a população não o faz sem exemplos. Inspira-se nos outros, neste caso, as figuras de proa do partido no poder”.

O Conselho de Ministros anunciou, esta semana, que de Dezembro de 2006 a Dezembro do ano passado, apenas 5% de um total de 4.2 mil milhões de meticais, concedidos pelo Governo nos últimos quatro anos, no âmbito  dos famosos “Sete Milhões” – Fundo de Desenvolvimento Distrital –, foram  reembolsados até aqui.
O Conselho de Ministros já decidiu, em sessão de Março passado, que irá, segundo o seu porta-voz, Alberto Nkutumula, levar, a partir de agora, os devedores dos “7 milhões” à cadeia. Refiro-me a cidadãos nacionais a quem o Governo decidiu entregar dinheiros que variam de menos de 10 mil a mais de 100 mil meticais,  desde 2006, para desenvolverem projectos no âmbito do projecto “Distrito como pólo de Desenvolvimento”. É esta faixa populacional que poderá enfrentar cadeia por não devolver migalhas do tesouro público.
Não discordo que sejam responsabilizados. Contudo, julgo que o Governo não é detentor de poder moral para vir publicitar que os mutuários não reembolsaram 95% dos 4.2 mil milhões de meticais que lhes foram atribuídos através de um projecto que, como dizia Jeremias Langa, na sua coluna de opinião “Em jeito de Fecho”, foi criado “sem normas, estas encontraram o jogo em andamento e...as normas lutam desesperadamente para se adaptarem ao jogo e aos intervenientes do mesmo”. Antes de vir publicamente anunciar, à imagem de “anjos trombistas”, que os pobres não devolvem migalhas e que serão detidos, devia, o Governo, denunciar os membros do seu partido que não devolvem, desde 2002, milhões de meticais ao Estado.
Ora vejamos alguns exemplos de devedores de somas avultadas de dinheiro do Estado, há cerca de nove anos. A TSL, uma transportadora, ora falida, criada pelos antigos combatentes, contraiu um empréstimo de 67.2 milhões de meticais, pouco mais de 2 milhões de dólares americanos. Nove anos depois, esta empresa ainda não desembolsou sequer um centavo. A empresa faliu há mais de quatro anos. Hoje, nem sequer instalações possui, mas os seus proprietários circulam com o à-vontade na praça, além de que possuem empresas. Ninguém os toca e ninguém veio publicamente dizer que eles serão levados à cadeia. Esse dinheiro é dado como perdido.
O grupo Mecula, propriedade do “camarada” Alberto Chipande, a quem a história atribui a autoria do primeiro tiro que marcou o início da guerra de libertação nacional, recebeu, em 2002, 42.2 milhões de meticais ao câmbio de 30 meticais, cerca de 1.5 milhão de dólares. De lá até Dezembro de 2009, apenas tinha devolvido cerca de 11%, ou seja, 5 milhões de meticais ao Estado, o equivalente a média de 1% de reembolsos por ano. O proprietário do grupo já veio publicamente dizer que ele e os outros membros da Frelimo são os detentores do direito à riqueza justamente porque lutaram pela libertação deste país.
“E se forem ricos (os dirigentes da Frelimo), qual é o mal? Afinal de contas não foram os mesmos que trouxeram a independência de que vocês estão a usufruir?”, disse Chipande no ano passado. Na mesma semana, quando a Frelimo veio tentar minimizar a gravidade das declarações do seu membro, alegando que ele tinha sido “mal entendido”, Chipande desmentiu-os, reiterando que não tinha sido mal entendido: “publiquem na íntegra, duas ou mais vezes ao dia, para que o povo possa ouvir. Não estou mal compreendido e eu quero que vocês (órgãos de comunicação social) divulguem mais as minhas declarações (de que eles têm direito à riqueza). Reafirmo o que disse”, vincou.
Este pronunciamento, conjugado com a dívida que possui com o Estado, era motivo para levá-lo à força à cadeia. Mas porque ele é ele, ninguém do Governo esboçou sequer uma tosse. As instituições de justiça fizeram de contas que não ouviram e nem viram os jornais que fizeram ecos bocejantes de um dos devedores do tesouro público há cerca de 10 anos.
Da lista dos devedores, há ainda a registar a falida Trans-Austral (38.3 milhões de meticais), a Cegraf de deputados da Frelimo, empresa que ainda goza de sanidade financeira, que mantém sob sua custódia os 11.9 milhões de meticais – apenas reembolsou 350 mil meticais de um total de 12.3 milhões de meticais que recebeu, conforme se pode ver na Conta Geral do Estado de 2009, analisada e aprovada este ano pelo Parlamento.
Na verdade, ao não devolver o dinheiro emprestado há quatro anos, a população não o faz sem exemplos. Inspira-se nos outros, neste caso, as figuras de proa do partido no poder. Se os devedores, há menos de quatro anos – de menos de 10 mil meticais (cerca de 300 dólares) até pouco mais de 100 mil meticais (pouco mais de 3 mil dólares) – devem ser detidos e encarcerados nas cadeias, também devem ser detidos, julgado e condenados, primeiro, os que mantêm consigo mais de 300 mil dólares americanos (mais de 10 milhões de meticais) do Estado, em diante, há cerca de 10 anos.

Fonte: O PAÍS

COMENTÁRIO: Aqui há coerência. Muita coerência!