sábado, 9 de fevereiro de 2008

AOS MANOS E MANAS por Edson da Luz(Azagaia)


“...Manos e manas,

Quando a comunicação social anunciou o recorde do preço do barril de petróleo, já se adivinhava uma nova subida do preço do combustível no nosso país o que causaria um agravamento de preços de produtos básicos. A seguir a comunicação social veio e confirmou os receios de todos nós, o combustível ia subir, o pão ia subir, e pior que tudo isso... o chapa ia igualmente subir, ora... ninguém estava a espera desta, talvez porque fosse inconsebível para um moçambicano que ganha o que ganha pensar sequer na hipótese do chapa subir. Bem..., o chapa ia subir mas discutia-se ainda para quanto ( o governo e os transportadores), as propostas eram tão absurdas que ou preucupavam-nos muito ou faziam-nos rir, veja-se esta: de 5Mt à 7.5Mt para14.5Mt à 19Mt se não estou em erro, uma subida na ordem de mais de 100%... he he he.. eramos nós a rirmo-nos da vida ou a vida a rir-se de nós.

Depois do tal braço de ferro entre os chapeiros e o governo, chegou-se a marca de 7.5Mt à 10Mt ( bem, há quem diga que aquelas propostas absurdas eram só para o governo se fazer passar por heroi baixando tudo aquilo...bocas!). Estavamos nas vésparas do fim de semana longo do Dia dos Heróis, e devido a tranquilidade que se vivia(embora alguns depoimentos que passavam na TV indicarem um desespero do povo) pensava-se: ou as pessoas conformaram-se, ou estão tão desnorteadas que nem sabem que fazer.

Na segunda-feira dia 4, circulavam algumas sms sobre uma possível greve no dia seguinte, dia em que entrava em vigor a nova tarifa, mas...duvido que se tenha levado à sério dada a passividade que nos é característica. Terça-feira dia 5, pela manhã, estava eu fora de casa a fazer os meus exercícios matinais quando começei a ouvir rumores duma greve que estava a acontecer na periferia... será?...recebia varias sms que reportavam o mesmo, e só quando o meu companheiro Keleza ligou-me a dizer que estava a presenciar a confusão, é que eu me dei conta da seriedade do assunto. Diziam que estava a ser transmitido em directo pela TV, nem mais...corri de imediato para casa e pelo caminho (na zona da baixa) notei um certo alvoroço nas ruas e...sim senhora! Estava a acontecer mesmo, o povo se rebelava contra a nova tarifa, aquilo foi o que se viu, nenhum chapa estava autorizado a circular e eu mesmo presenciei um deles a ser apedrejado pelo povo. Coisa igual há muito que não se via, lembro-me de algo pior no ano de 1992 se não me falha a memória e pelo mesmo motivo, o povo literalmente destruiu a cidade.

O povo queria destruir tudo que fosse sinónimo de riqueza e bem estar, carros, lojas, bancos, e não escaparam as bombas de gasolina e padarias. Grande cagaço...o pessoal da classe média e alta nem punha o nariz fora de casa, o povão estava dicidido. O governo reagiu de forma cobarde, mandou os seus cães de guarda, a nossa famosa policia que foi lá e fez o que melhor sabe fazer, vilolentou o povo, tiros para o ar com balas de borracha para disperçar o povo rebelde...tiros para o ar? Balas de borracha só? Bem, o que se sabe é que houve vitimas mortais desses tiros, quem paga? Isso é outra história. E por aí à fora...não quero aqui fazer um rescaldo, era só para lembrar.

Agora, o que me fez escrever este texto é facto de eu ter feito uma música sobre estes acontecimentos e a coragem heróica do povo. Povo...afinal quem é o povo? Sabe... eu que julgava saber muito bem a resposta para esta pergunta, confesso que na terça-feira fiquei em dúvida, isto porquê...ora vejamos: ouvi muita gente conhecida a dizer que o povo está fazer greve mas com uma expressão de claro distanciamento, curiosamenete esse discurso vinha de pessoas da classe média e alta que provavelmente não se encomodavam assim tanto com a subida dos chapas...perdoem-me se me engano. Eu penso que se dependesse da classe média não haveria greve nenhuma, reclamariamos sim nos corredores do serviço, nos murros dos prédios, na segurança dos nossos lares mas não passaria disso. E foi enjoado com essa apatia que liguei para o Keleza e disse-lhe claramente que nós tinhamos que nos manifestar, mostrar a nossa posição, afinal de contas somos povo não somos?! Para a minha felicidade e conforto ele concordou imediatamente, nós como artistas também somos povo e temos que mostrar a nossa posição perante este problema que também é nosso, estavamos no momento cheios de emoção mas vazios de estratégias, mas iamos pensar...surgiu à tardinha a ideia de convocarmos outros artistas e nos dirigirmos a imprensa, aproveitariamos a conferência de imprensa que seria dada pelo governo naquela tarde, mas depois achamos melhor esperar pelo pronunciamento do governo para reagirmos, o Joe votou para esta posição e ficamos à espera, mas nunca mais se ouvia algo da comunicação social, o que só veio a acontecer à noite na hora do telejornal.

Durante a manhã e a tarde eu recebia varias mensagens de pessoas a pedirem-me para escrever uma música sobre a greve, ligaram-me outras a dizerem que eu já devia ter preparado uma bomba para a ocasião, mas eu à principio não queria ser o ladrão feito pela ocasião e quase que nem considerei essa hipótese, pensava para mim que seria demasiado óbvio, inclusive o meu companheiro Izlo fez o mesmo comentário, que o tema cansaria as pessoas...política e mais política. Estava convencido de que não ia escrever nada sobre o assunto até que vendo o tempo passar e confrontado com a triste realidade de ninguém para além do povo da periferia se “pronunciar” sobre o assunto, decidi começar a rabiscar qualquer coisa só para libertar o desejo de me manifestar. Não estava certo se gravava aquilo...estava puro, vinha do fundo meu coração mas...receava ser demasiado óbvio e previsível...QUE SE LIXE A PREVISIBILIDAE!!!!!!! Eu é que não vou ficar alheio a isto, pensem o que quiserem pensar, chamem-me os nomes que me chamar, oportunista, comercial, o rapaz dos desabafos ou sei lá o quê! Mas antes de me apelidarem, perguntem-se onde voçês estavam, o que estiveram voçês a fazer quando o povo da periferia estava a manifestar-se. A greve resultou, mas não resultou apenas para os que arriscaram as suas vidas nas ruas, resultou também para ti que estavas a curtir o fim de semana que se prolongou, tu que estavas a fazer piadas sobre os que se entregavam de corpo e alma à luta, tu também vais pagar 5Mt e 7.5Mt no chapa e não 7.5Mt e 10Mts, e de certeza vais poupar um pouco mais e vais respirar de alívio. As várias associações da sociedade civil não mostraram a sua posição, os músicos, os escritores, e todos que seriam afectados directa ou indirectamente pela subida dos chapas. Detestei essa falta de organização nossa, esse distanciamento, podiamos ter feito mais, podiamos ao menos ter sido mais solidários e mostrado a nossa união. Eu fiz humildemente esta música para mostrar a minha solidariedade, podia ter feito mais reconheço, mas cada um na sua frente. Eu uso a música para lutar e tu??

Povo no poder” é uma música de celebração do poder do povo, júbilo e glória, quero dedicá-la em especial aos que perderam a vida nesta greve vítimas da nossa polícia, esses para mim são verdadeiros heróis, dignos de repousarem na cripta dos nossos corações, com a chama sempre acesa. POVO NO PODER!!!!...”.

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