Me sugeriram a leitura e reflexão do texto abaixo, de Egídio
Guilherme Vaz Raposo, que já circula em vários cantos da internet. Um texto que
realmente vale a pena ler e reflectir seriamente a volta das questões que o
autor levanta. Título de meu.
"O que é uma GRAÇA?
GRAÇA significa por outras palavras, FAVOR DESMERECIDO.
Nas relações políticas não há graça; portanto não existe favor
desmerecido de ninguém para ninguém. Logo, não há graça que venha de
quem nos governa nem de nós, povo, cidadãos, para quem nos governa.
O estado e o governo são as únicas entidades modernas do mundo com
direito sancionado pelo constitucionalismo local e global para explorar o
homem pois trata-se de uma EXPLORAÇÃO DO HOMEM-PELO-HOMEM MITIGADA à
luz do contrato social que vigora entre o povo e estas duas entidades.
Cidadãos conscientes dos seus direitos não pedem aos seus governantes
nada. Pelo contrário, EXIGEM deles, pois o contrato social prevê
deveres, obrigações e direitos de ambos lados. NÃO HÁ NADA QUE O POVO
RECEBA DE GRAÇA DO GOVERNO OU ESTADO! E o povo não deve nada aos
governantes; pelo contrário!
Um dos desafios que o nosso país enfrenta é o acesso a informação pelos
cidadãos capaz de os permitir exercer com competência os demais deveres e
direitos constitucionalmente garantidos.
Por causa desta falta de informação, em “Nangade ou Funhalouro”, o povo;
os cidadãos NÃO sabem que o poço ou furo abertos e inaugurados pelo
Administrador local não são uma graça, portanto, favor desmerecido dos
governos destes pontos para os povos destes pontos do país; pelo
contrário, é o seu dever, cujo cumprimento já vem tarde.
O ESTADO; o Governo, exploradores legais do povo moçambicano, educam
este mesmo povo a ver toda obra por ela feita como uma benfeitoria sua;
UMA GRAÇA e por esta via, obrigado a dizer OBRIGADO GOVERNO [porque
trouxe-nos isto ou aquilo]!
As cidadãs em Majune ou Chimuara não sabem que dar luz em casa por falta
de hospitais com condições não é seu destino ou castigo por estarem
longe de Morumbala ou perto de um; pelo contrário, é resultado do
incumprimento por incapacidade ou impossibilidade do Governo suprir as
necessidades sufragadas em pleitos eleitorais.
Choro de tristeza quando vejo ou ouço em mensagens ou discursos de
cidadãos sofridos a PEDIR algo ao Presidente da República ou Governador
qualquer, bens essenciais como água, estrada ou hospitais durante as
presidências abertas ou comícios similares.
Por falta de informação estes Não sabem que GRAÇA é um favor desmerecido
e que eles nada devem a estes; antes pelo contrário, eles não fazem
nada mais senão cumprir o seu dever. O dever de governar bem. Nesta
ordem de ideias, EXIGIR seria a palavra que devia substituir o PEDIR. O
povo moçambicano não deve pedir nada a mais nenhum governante. Pelo
contrário, DEVE EXIGIR de qualquer governante as promessas eleitorais de
acordo com as competências de cada um deles. Porque assim estará a
exercer seus direitos, da mesma forma que este cobra impostos ao cidadão
ou o sanciona em caso de incumprimento.
CRITICAR o governo deverá ser um exercício normal, perante o
incumprimento das promessas eleitorais ou quando más decisões são
tomadas. Quando o governo ou estado cumpre com as promessas eleitorais,
ou faz boas coisas, o povo, o cidadão deve ver isto como normal,
previsível, obrigação legal, prevista no contrato social.
Pelo contrário, devemos todos zangar, gritar e censurar, quando
elementos que compõem estas entidades roubam, não cumprem com as
promessas eleitorais, ou chamam os outros de tagarelas ou coisa
parecida.
Sinto dores quando vejo um povo roubado oferecer a um político ovos. Em
sociedades normais, não devia ser o povo sofrido, pobre, juntar os
poucos ovos de uma comunidade para oferecer o “chefe”, em sinal de
“reconhecimento” quando este visita uma aldeia, comunidade ou distrito! E
este chefe, nestas condições, devia ter vergonha suficiente e por isso
agradecer o gesto e imediatamente devolver os ovos coletados pelos seus
caciques!
Quantas vezes não vemos nós administradores distritais, governadores e
até ministros e o próprio Presidente da República a receber um monte de
presentes, entre pontas de marfim, cabrito, bois, galinhas, patos, ovos
de todo tipo de aves, abóboras, maçanica, malambe, couve alface, peixe,
camarão, mandioca, etc., de pobres cidadãos cuja oferta, nem sempre
livre e sim coerciva ou induzida, custou sacrifícios avultados? Mas
quantos destes dirigentes não viaja com tudo pago e ainda espera do
subordinado as honras de casa? E quantos subordinados não sofreram por
isso?
É na assimetria da informação em relação ao conteúdo e implicações do
contrato social que a classe dirigente e seus intelectuais orgânicos e
anti intelectuais encontram o húmus para a reprodução da impunidade,
falta da responsabilização e subjugação do povo que se diz soberano mas
na prática explorado até ao tutano.
O acesso a informação não é apenas condicionado pela dificuldade para o
seu alcance e uso. É igualmente na deficiência do sistema de ensino, na
promoção da ignorância e na repressão que se materializa a estratégia
“estupidificadora” de todo povo moçambicano, que é levado a pensar que
as obras do Governo são “graças”.
Agora que você sabe que graça é um favor desmerecido e que não deve nada
ao estado ou governo, saiba mais isto:
1. Não foi GRAÇAS a FRELIMO que a independência chegou a Moçambique.
Dizer isso é fazer propaganda política desnecessária, encenando o
contrabando semântico. O povo moçambicano unido em torno de um movimento
chamado FRELIMO lutou pela independência deste país. por isso você
também é herdeiro dos benefícios da independência deste país;
independentemente da idade que tem; é dono deste país e tem todos os
direitos como qualquer nacional; os seus ancestrais lutaram por ele, e
não é culpado por não ter estado em Nachingweya, mesmo que fosse para
”jogar a bola” e “escapar à morte. Não deve por este motivo ser
privilégio apenas dos filhos de dirigentes atuais ou das elites
políticas, ter acesso a riqueza. Ela, a riqueza, deve ser para todos e
distribuída de forma equitativa.
2. Se você nasceu depois de 1975 não deve se sentir endividado por
qualquer grupo etário ou que se diz ter lutado pela independência.
Agradeça pelos seus feitos, mas não se acobarde quando eles te roubam
descaradamente ou tomam decisões lesivas não só para si como para todo o
país. Ser herói é ser exemplo. Não é usar o passado glorioso para
perpetrar a pobreza ou roubar aos jovens e o futuro do país. Não é usar a
glória do passado para fins ínvios. Denuncia.
3. Você não está obrigado a elogiar qualquer feito ou obra do governo.
Na verdade foi você quem o fez. O Presidente da República, o Governador,
o Administrador, o Chefe do posto, todos estes já recebem dinheiro e
regalias; um salário mensal suficiente para dirigir este país. Por sua
vez, os ministros, secretários-permanentes, diretores de escola e outros
são pagos mensalmente e têm direitos e privilégios a mais [mais que
você, porque você os sustenta através dos seus impostos ou negócios que
estes fazem em seu nome] para trabalharem para si.
4. Por isso, você deve se irritar, deve zangar-se e ficar inconsolado e
fazer qualquer coisa quando eles roubam ou quando favorecem seus
afilhados e compadres nos negócios do estado e ou com estado. Isto é
corrupção. Os titulares destes postos devem ser corridos, porque agem de
ma fé e as suas obras lesam o estado e o interesse comum. Você não deve
continuar a naturalizar a corrupção! Faça algo! Denuncia. Escreve no
seu mural, o que viu; o que sentiu; critica.
5. Não se deixa enganar. É seu direito saber como os negócios do Estado
são feitos e como se chegam a decisões em relação a vários assuntos. O
seu direito como cidadão não se esgota no voto; pelo contrário, continua
com a missão de escrutinar os que falam em seu nome e fazem obras em
seu nome. É seu direito saber, questionar e criticar sempre que não
julgar apropriada uma determinada decisão do seu governante.
6. Em uma única palavra: cidadão, você deve criar em si um comportamento
de permanente suspeita e vigilância em relação ao estado e governo.
Suspeita tudo o que eles fazem até que eles lhe convençam sobre a
sanidade das suas decisões. E eles têm o dever de explicar
tintim-por-tintim o dinheiro que eles gastam em seu nome. Saiba de uma
coisa: você não deve nada a ele; pelo contrário, ele deve muito a você.
Eu nunca irei elogiar o governo ou estado! Não preciso. É um ato de
cobardia e estupidez elogiar o governo! Ele é meu servo! E tudo de bom
que faz é normal, previsível; sua obrigação. Não há “esforços do governo
que visam” isto ou aquilo; “não trabalham no sentido de” eu mando,
exijo e chateio-me quando as suas promessas tardam em se materializar.
Eu “odeio” o Estado! Ele é por defeito, um ladrão do povo. E eu sei
disto. Só não o insulto porque temos um contrato por cumprir. Portanto,
eu sei que vivo uma exploração do homem-pelo-homem mitigada pelo
contrário social. E como contrato, não há favores!
E aqui nas redes sociais, há quem sempre gosta de me alertar que o
governo faz boas coisas e por isso devo reconhecer e elogiar!"
Egidio Guilherme Vaz Raposo.
Sem comentários:
Enviar um comentário